Carta aberta a Reinaldo Azevedo

Prezado Reinaldo,

Adorei sua última coluna na Veja defendendo o candidato Levy Fidelix que no último debate abusou dos ouvidos de todos os bons brasileiros. Adorei! Tanto que estou compartilhando os seus argumentos hoje aqui no meu perfil.

Bom, todos sabem que Levy Fidelix andou proferindo frases pelas quais está sendo acusado de estimular a homofobia no último debate dos presidenciáveis. A despeito do Brasil ter sido retirado pela primeira vez do mapa da fome, foi a postura dele que deu tanto ibope na rede. Como você próprio, Reinaldo, destacou, para quem não viu ou leu, eis algumas das antológicas proposições do candidato: “dois iguais não fazem filho”;. “aparelho excretor não reproduz”; “como é que pode um pai de família, um avô, ficar aqui, escorado (?), com medo de perder voto? Prefiro não ter esses votos, mas ser um pai, um avô, que tem vergonha na cara, que instrua seu filho, que instrua seu neto.”; “que façam um bom proveito se quiserem fazer de continuar como estão, mas eu, presidente da República, não vou estimular. Se está na lei, que fique como está, mas estimular, jamais!, a união homoafetiva”.;“esses que têm esses problemas, que sejam atendidos no plano afetivo, psicológico, mas bem longe da gente, porque aqui não dá”.

E a seguir, meu caro Reinaldo, você diz: “Trata-se de um apanhado de bobagens? Não resta a menor dúvida. Mas há crime? Ora, tenham a santa paciência!”. E continua, para meu total deleite: “Observem que ele nem mesmo diz que pretende mudar a legislação se eleito. Apenas assegura que, se presidente fosse, não estimularia a união homoafetiva. Cadê o crime? Fidelix também entende que sexo tem como fim a procriação. Eu acho que ele está errado, mas me parece que tem direito a uma opinião, não é mesmo?”.

O meu deleite em ler tudo isso, meu caro, é que você representa essa revista da qual eu tenho nojo. Tenho escárnio pelo trabalho que vocês fazem conjuntamente que dizem ser jornalismo. Ver o meu inimigo me dando munição assim fácil é bom demais. Bom demais! É ótimo até para que todos que compartilham seus textos por aqui na rede saibam quem, de fato, você é.

Reinaldo, vou te ajudar: você como “jornalista” deveria saber que o direito ao livre exercício de pensamento e o direito à liberdade de expressão são garantidos pela Constituição. Isso, porém, não legitimiza ninguém a incitar à violência porque, meu lindo, isso pode trazer consequências mais graves à vida de outras pessoas, sabia? E há também o direito de qualquer cidadão de preservar a sua integridade física, psicológica e de ser livre para fazer a opção sexual que melhor lhe agradar.

Daí você nos pergunta: “A fala de Fidelix é imbecil, sim, mas é criminosa?”. Sim, Reinaldinho do meu coração. Sabe por que? Porque alimentam a intolerância, o ódio, a discriminação. No mais, você não destacou uma fala importante de Fidelix que é a prova do crime, sim senhor, que ele cometeu, mas eu o faço: “Vamos ter coragem! Nós somos maioria! Vamos enfrentar essa minoria. Vamos enfrentá-los!”. Voltamos à época da Inquisição? Entenda, Reinaldo: o exercício da liberdade de expressão pressupõe responsabilidade. Não há crime em declarar o que pensa, mas a forma como se faz isso faz total diferença. Daí, você como “jornalista” vir publicamente e defender o direito de se expressar dessa forma tal como Fidelix fez ao invés de ajudar nosso país a buscar uma convivência mais harmoniosa, mostra bem qual é o seu conceito de civilidade. Eu já sabia, mas agora acho que, depois dessa, quem compartilhar seus textos está ajudando a divulgar essa sua opinião, a dizer, que é lícito conclamar as pessoas para desrespeitar ainda mais aqueles vistos como diferentes.

Mas o que foi mais legal, Reinaldo, o que eu adorei mesmo foi você ter se perguntado “É a única tolice que afirmou nessa campanha? Não!”, daí criticou Luciana Genro, mas claro, disse que a maior imbecilidade foi dita pela atual presidente que “pregou a negociação com terroristas”. E termina quase me fazendo soltar fogos dentro de casa: “Até que alguém me prove o contrário com a Constituição nas mãos, um brasileiro é livre para fazer digressões sobre o aparelho excretor ou para dizer que, se eleito, não promoverá o casamento gay. Já o presidente da República Federativa do Brasil NÃO É livre para pregar a negociação com terroristas”. O seu argumento, caro Reinaldo, foi porque ela disse que o conflito entre Israel e Palestina “deve ser solucionado e não precariamente administrado, como vem sendo”. “Negociações efetivas entre as partes têm de conduzir à solução de dois Estados – Palestina e Israel – vivendo lado a lado e em segurança, dentro de fronteiras internacionalmente reconhecidas”. Mas, em momento algum, você foi capaz de dizer que no discurso da ONU, pelo qual foi aplaudida de pé, ela disse: “Nós repudiamos sempre o morticínio e a agressão dos dois lados. E, além disso, não acreditamos que seja eficaz. O Brasil é contra todas as agressões. E inclusive acha que o Conselho de Segurança da ONU tem que ter maior representatividade, para impedir esta paralisia do Conselho diante do aumento dos conflitos em todas as regiões do mundo”.

Para finalizar, a cereja do bolo foi me dizer que Dilma quer conversar, negociar, trocar figurinhas com aqueles “que cortam cabeças e praticam fuzilamentos e estupros em massa”. Tive que vir a público, eu também, agradecer-lhe por essa iguaria e compartilhar com todos meus amigos o seu discurso.

Com um inimigo intelectual como você, confesso, perdeu até um pouco da graça agora. Mas… continue, Reinaldo. Estou adorando!

Atenciosamente, muuuito atenciosamente sempre

Elika Takimoto

3 comentários em “Carta aberta a Reinaldo Azevedo

  1. Por que enfrentar o comportamento de uma minoria significa necessariamente incitar à violência? Eu posso simplesmente não concordar com as praticas e enfrentar a pressão social que tenta ir contra o meu ponto de vista.

    E você esta procurando inimigos intelectuais no lugar errado. Ora, pegue um José Guilherme Merquior e terá um liberalismo conservador verdadeiramente erudito.

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  2. Minha cara, confesso que no início da leitura deste seu texto fiquei alarmada, achei que você faria uma espécie de elogio da escrotice, mas, assim que cheguei aos poréns, antes de continuar a leitura e ter os últimos espasmos de alívio e contentamento, fui até o topo e cliquei em ‘seguir’. Clap clap clap…

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