O tema é polêmico. Uma transexual se prendeu à cruz encenando o sofrimento de Jesus, para “representar a agressão e a dor que a comunidade LGBT tem passado”.
A intolerância, o ódio e a facilidade com que toda e qualquer tipo de notícia ou opinião é disseminada nas redes sociais fazem com que os exércitos se municiem para defender seus pontos de vista e pouco dialogam entre si. A guerra está declarada. Será?
De um lado: os evangélicos que se sentiram extremamente ofendidos. Consideraram blasfêmia,deboche e uma provocação aberta aos cristãos. Feliciano não tardou em perguntar: “Falar mal de gay não pode, mas isso pode?!?”. O famoso pastor não perdeu a oportunidade de aproveitar ao máximo o episódio para se autopromover. Quanto mais animosidade entre cristãos e gays, melhor para eles. E dá-lhe, portanto, mais lenha para um fogo que ajuda a cozinhar um alimento pra lá de indigesto.
A liberdade de expressão, de fato, é um bem precioso que temos, mas tem limites, e a verdade é que a esmagadora maioria deles são impostos por aqueles que defendem a liberdade sem limites sempre que é a “sua” liberdade a sofrê-los. E foi aí que a coisa ficou tensa para os dois lados.
Se uma parte de mim acha que é preciso respeitar a crença, os símbolos sagrados e que devemos exigir respeito respeitando, a outra parte diz que os religiosos passaram dos limites querendo impôr regras de conduta se metendo na vida e na forma de amar das pessoas. Enquanto as normas ficavam entre eles, tudo bem. A partir do momento que temos uma bancada evangélica na câmara que se mostra altamente conservadora, mexe com o Brasil inteiro: Gays, lésbicas, macumbeiros, ateus, trans, simpatizantes e antipáticos de qualquer espécie.
Compreendo perfeitamente o choque dos cristãos tradicionais com a foto, assim como entendo o objetivo de quem se propôs a fazer tal chamado. Este último, concordo, mais sutil de entender ainda que completamente justificável e plausível. O ponto é que tem mais gente interessada em colocar lenha nessa fogueira do que ouvir o que outro tem a dizer. Dizer que é ofensa e ponto final é querer simplificar uma luta literalmente sangrenta para o outro lado que pede para ser ouvido e compreendido. Amado também por você, diria.
Vamos raciocinar: houve mesmo desrespeito? Ou seria um pedido de socorro? A metáfora não pode ter sido mal compreendida? Analisemos: sobre a cabeça do transexual crucificado havia uma placa que dizia “Basta de homofobia”. Todos os dias lemos notícias de gays, trans e lésbicas sendo senão mortos agredidos ao extremo. Os casos aumentaram com o aumento da bancada evangélica e isso não pode ser coincidência. No mais, serão todos os gays anti-Cristo ou ateus? A própria transexual já deixou claro que é cristã, que a parada gay para ela é um protesto e não uma festa e que usou as marcas de Jesus, que foi humilhado, agredido e morto com uma nobre intenção. Justamente para mostrar o que tem acontecido com muita gente no meio GLS. De uma certa maneira, não podemos dizer que essa parte da sociedade não está sendo crucificada todos os dias? Jesus não foi morto também por intolerância?
A imagem é forte. E choca. Mas foi para chocar mesmo. Se ela não tivesse desfilado na parada gay, estaríamos vendo fotos de uma multidão segurando bandeiras coloridas e não discutindo o assunto. Choca a imagem assim como deveria chocar qualquer ser humano a imagem de um gay sendo espancado, morto, desfigurado por um homem que se diz cristão. Mas não paramos para falar sobre eles.
E a pergunta que não quer calar. Se Jesus estiver vendo tudo isso, Ele se ofenderia? Não parece que Ele, por tudo que está escrito no Novo Evangelho, se sentiria muito mais ofendido vendo pessoas usarem o nome Dele para pregar a intolerância e o ódio do que pelo fato de alguém estar usando a imagem de Sua crucificação que, vale frisar, foi causada também pela intolerância de ideias? Quem foi Jesus afinal senão um homem que pregava o amor e que foi torturado e morto por suas opiniões consideradas subversivas? Parece ainda, olhando sob este viés, que o intuito da imagem de uma transexual crucificada foi ofender? Ou, se deixarmos o orgulho hétero de lado, não acha que podemos considerar a imagem de uma trans sangrando na cruz como um aviso de que estamos chegando a níveis perigosos de falta de amor? Faz sentido falar em cristofobia incentivada pela imagem? Não foi isso os que a idealizaram quiseram sugerir. Pelo contrário.
Por fim, se os Malafaias e Felicianos da vida cuidassem somente dos seus rebanhos e deixassem livre o resto da sociedade de seus discursos de ódio contra os homossexuais, enfim, se esses líderes ditos religiosos pregassem o amor e o respeito ao próximo e parassem de usar Jesus de forma criminosa como estão fazendo escancaradamente, toda essa confusão não teria sido evitada?
A guerra ou a paz está sendo clamada na imagem? Para mim, ficou claro, a segunda opção.