Direita e Esquerda. Ensino Fundamental.

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Yuki, meu caçula de oito anos, perguntou-me o que estava acontecendo no Brasil quando viu pela televisão imagens da manifestação de ontem, 16 de Agosto de 2015. Ao ver crianças dando entrevistas, ele se interessou. Criança pode ir à manifestação, mãe? Pronto, lá estava eu numa saia justa. Sou contra a doutrinação de crianças. Acho que cabe a mim como mãe ensinar meus filhos, sobretudo, a pensar. Todos, porém, que me acompanham sabem que tenho a minha posição política muito bem definida, o que, ao meu ver, não me dá o direito de decidir qual será o lado que meu filho jogará dentro da política: esquerda ou direita. O próprio Yuki percebendo a minha hesitação ajudou-me ao perguntar justamente a diferença entre esquerda e direita, já que os próprios jornalistas toda hora mencionavam essas palavras.

– Por que não positivo ou negativo, mãe? Ou branco e preto, por exemplo?

– Bom, essa é uma boa forma de começarmos. Isso tudo começou lá na França, há pouco mais de duzentos anos. O sistema político dos franceses nessa época era composto por grupos bem definidos, sendo que um deles formado por comerciantes e artesãos, por exemplo, era o único que tinha a obrigação de pagar os impostos, além de terem inúmeras limitações, como o fato de não poderem ocupar cargos públicos, por exemplo.

– Mas pode isso?

– Pois então. Parece meio injusto, não? Por isso talvez, pelo fato dos privilégios serem dados somente a uma pequena parte da população, que se iniciou a famosa Revolução Francesa. Nessa época, a burguesia procurava, com o apoio da população mais pobre, diminuir os poderes da nobreza e do clero. Daí então, para se criar uma nova Constituição, montaram uma Assembleia Nacional Constituinte. Acho que as camadas mais ricas não gostaram da participação das mais pobres, e preferiram não se misturar, sentando separadas, do lado direito. Não sei ao certo se foi isso, mas sei que a galera que representava o povão menos favorecido ficou posicionada à esquerda. Por isso, até hoje, o lado esquerdo foi associado à luta pelos direitos dos trabalhadores, e o direito ao conservadorismo e à elite.

Dentro dessa visão, ser de esquerda presumiria lutar pelos direitos dos trabalhadores e da população mais pobre, a promoção do bem estar coletivo e da participação popular dos movimentos sociais e minorias. Já a direita representaria uma visão mais conservadora, ligada a um comportamento tradicional, que busca manter o poder da elite e promover o bem estar individual.

Mas o mundo, meu filho, é muito mais complexo do que isso. Com o tempo, as duas expressões passaram a ser usadas em outros contextos. Hoje, as palavras ‘esquerda’ e ‘direita’ parecem não dar conta da diversidade política do século 21. Os contrastes até hoje como você pode ver existem, porém, não são mais do tempo em que nasceu a distinção. De uma forma geral, uma diferença crucial seria que a esquerda busca promover a justiça social enquanto a direita trabalha pela liberdade individual. Tivemos uma época no Brasil, por exemplo, da Ditadura Militar…

– O que é Ditadura Militar, mãe?

– Bem, podemos dizer que foi um período da política brasileira em que os militares governaram o Brasil. Esta época vai de 1964 a 1985. Caracterizou-se pela supressão de direitos constitucionais, censura, perseguição política e repressão aos que eram contra o regime militar, ou seja, pela falta de democracia.

– O que é democracia?

– A palavra democracia tem sua origem na Grécia Antiga. Demo quer dizer povo, kracia, governo. Dessa forma, a democracia pode ser entendida como um regime de governo onde o povo (cidadão) é quem deve tomar as decisões políticas e de poder.

Então, meu filho, continuando: essa divisão de direita e esquerda se fortaleceu muito no período da Ditadura Militar, onde quem apoiou o golpe dos militares era considerado da direita, e quem defendia o regime socialista, de esquerda.

– O que é socialista?

– Bom, o Socialismo é um sistema político-econômico ou uma linha de pensamento criado no século 19 para confrontar o liberalismo e o capitalismo. A idéia foi desenvolvida a partir da realidade na qual o trabalhador era subordinado naquele momento, como baixos salários, enorme jornada de trabalho entre outras.

Nesse sentido, o socialismo propõe a extinção da propriedade privada dos meios de produção e a tomada do poder por parte do proletariado e controle do Estado e divisão igualitária da renda. Todos ganham o mesmo. Não há como dentro do socialismo um ter carro zero enquanto o outro não tem o que comer. Isso, porém, é um sonho. Diria que é praticamente impossível pensar nesse regime.

Mas hoje, muitas outras divisões apareceram dentro de cada uma dessas ideologias de esquerda e de direita. Atualmente, os partidos de direita abrangem conservadores, democratas-cristãos, liberais e nacionalistas, e ainda o nazismo e fascismo na chamada extrema direita. Na esquerda, temos os social-democratas, progressistas, socialistas democráticos e ambientalistas. Na extrema-esquerda temos movimentos simultaneamente igualitários e autoritários. Cada qual dos lados, em diversos momentos da história (sobretudo no século 20), empenhou-se até a barbárie para fazer valer sua visão ideológica de mundo.

– Não tem meio termo? Eu tenho que escolher em que lado quero ficar?

– Não precisa. Há a posição de “centro”, por exemplo. Esse pensamento consegue defender o capitalismo sem deixar de se preocupar com o lado social. Em teoria, a política de centro prega mais tolerância e equilíbrio na sociedade. No entanto, ela pode estar mais alinhada com a política de esquerda ou de direita dependendo de sua visão sobre a economia. Por exemplo, os de esquerda pregam uma economia mais solidária, com maior distribuição de renda. Os de direita seriam associados ao liberalismo, doutrina que na economia pode indicar os que procuram manter a livre iniciativa de mercado e os direitos à propriedade particular. Algumas interpretações defendem a total não intervenção do governo na economia, a redução de impostos sobre empresas, a extinção da regulamentação governamental, entre outros. Mas veja que confuso e difícil, isso não significa que um governo de direita não possa ter uma influência forte no Estado, como aconteceu na Ditadura.

– Liberalismo me parece um nome bonito…

– E é. Na raiz, o adjetivo liberal é associado à pessoa que tem ideias e uma atitude aberta ou tolerante, que pode incluir a defesa de liberdades civis e direitos humanos. Mas não podemos esquecer que essa “liberdade” pode ter como consequência a privatização de bens comuns e espaços públicos o que poderia gerar mais desigualdades sociais.

A coisa, no entanto, é muito complexa. Por exemplo, o pensamento conservador geralmente é associado à direita. Propostas progressistas, à esquerda. No entanto, ambos, conservadores e progressistas, não raro, associam-se com liberais. É o caso, por exemplo, de quem defende ideias progressistas, como o aborto, políticas de cotas etc., mas defende a liberdade econômica, isto é, livre mercado, livre concorrência etc.; ou, ao contrário, quem defende política antiaborto, política contra as cotas e contra programas sociais fomentados pelo Estado, mas também se ajusta, igualmente, à prática do liberalismo econômico. Do ponto de vista político e ideológico, progressistas e conservadores divergem, mas concordam, por vezes, quanto à economia. Vê-se, então, que o problema é mais complexo do que se imagina.

– Não sei se estou te entendendo…

– Se você está confuso é sinal de que está bem informado e que agi honestamente. Quando, meu filho, neste mundo você vir uma pessoa com ideias muito claras sobre política, saúde, economia, progresso… pode ter certeza de que essa pessoa está mal informada. Fiquemos por aqui e aguardemos as próximas imagens e notícias para voltarmos a discutir.

– Quando você for à manifestação eu posso ir com você como essas crianças estão indo hoje?

– Não, meu filho. Quando participo de uma manifestação pode ter certeza que ninguém vai confundir a minha luta com piquenique.

Perdão, senhor, não sou de ferro. Fiz o melhor que consegui.

manfestaõ

4 comentários em “Direita e Esquerda. Ensino Fundamental.

  1. Tiraram meu comentário ? Alguma coisa errada em relação ao que eu escrevi sobre “e ainda o nazismo e fascismo na chamada extrema direita” qualquer um pode ter acesso ao wikipédia e pesquisar sobre nazismo e fascismo, dei um exemplo do Hitler que era o chefe do Partido dos Trabalhadores alemão, o qual era um nazista. Simplesmente a frase em aspas sobre extrema direita está equivocada.

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    1. Sim, tirei. Você entrou na minha casa. Eu estava falando educadamente sem agressividade alguma com todos vocês. Seu tom foi agressivo. Chamou-me de ignorante na primeira vez que entrou aqui.

      Na minha casa, as pessoas se dão o respeito. Pode vir, pode voltar quando quiser. Mas não venha aqui me chamar de burra. Faça o seu blog e despeje sua raiva lá. Aqui é só amor.

      Críticas são bem vindas sempre. Apontar equívocos e colaborar para melhorar a discussão só tenho a agradecer. Como dessa vez o tom mudou, o comentário fica e desde já agradeço por ele.

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  2. Discordo do parágrafo em que vc diz que se a pessoa está confusa é porque ela está bem informada. Incluindo todo o restante do parágrafo…. Temos que defender projetos claríssimos para que os governos possam implementá-los… Se puder esclarecer-me se confusão de idéias é o melhor….. Abs fraternos!

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    1. Oi, Neide

      Isso é uma percepção que tenho do mundo. Em todos os assuntos em que me meti a discutir a ideia estava clara na proporção inversa do conhecimento e na informação que eu tinha sobre eles.

      Conforme vamos adquirindo informação e aprofundando o nível da discussão, acho eu, a clareza vai se esvaindo.

      Os projetos devem ser claros, lógico. Agora saber o que é melhor é que são elas porque o conceito de progresso é altamente controverso e subjetivo.

      Obrigada pelo comentário.

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