Eu no Tinder

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Sábado passado à noite, eu estava comendo miojo de tomate vendo vídeos do padre Fábio de Melo. Para esclarecer, eu não sou e nem virei católica. Apenas achei um homem perfeito para mim.  Ele é mega inteligente, fala muito bem, canta muito afinado, charmoséééésimo, hiper espirituoso no twitter, lindo, lê muito, giga estudioso, carismático ao extremo. Mas é padre. O padre Fábio de Melo. Detalhes sem importância… Sigo trabalhando firme pelo nosso amor. Enfim, estava eu e meu sábado bombando quando decido fazer algo: uma coisa ultra diferente em minha vida. Um troço que jamais sonhava em fazer. Algo de muito risco e que teria, inclusive!, que fazer escondido. Ui! Então, tcharããã!, entrei no Tinder.

Vamos ver qual é dessa budega.

A coisa é bem profunda para não dizer o contrário. Para os neófitos como eu era, vou explicar rapidamente: o Tinder é um aplicativo que colocamos no celular que aparecem fotos de, no meu caso, rapazes. Daí, ou você marca um X e dispensa sem pena o carinha, ou marca um coração e a foto dele cai para outro lado da tela. Simples. Beleza. Consigo. Super consigo fazer. Mole.

Foto na praia mostrando o barrigão sarado X.
Foto com cordãozão grossão no pescoço X.
Foto ao lado do leão no zoológico de Buenos Aires X.
Foto de selfie na academia XXXXXX.
Selfie fazendo cara de sexy. XXXXXXXXX
Foto de tatuagem do vasco no peito XXXXXXXXXX
“Sou libriano bababá bububú”. XXXXXXXXXXX
“Estou aqui para te tirar daqui”. XXXXXXXXXXX

Mas gente, não tem nenhum com o fundo de uma biblioteca atrás? Tá bom. Ok. Marquei coraçãozinho em uns carinhas sem o menor entusiasmo porque não estava vendo sentido nenhum naquilo.

Daí eu pensei que fosse só isso mesmo e já estava bocejando quando, de repente não mais que de repente, a tela muda do nada e diz que eu combinei com um lá que eu havia marcado um coraçãozinho. Como assim? Ele viu? Ai que vergonha!!! E como sabe se eu combino com ele se eu nem informei nada?

E daqui a pouco, mais “combinação” e mais e mais. Caraca! Que devassa! Que vergonha! Não tem opção de me esconder atrás da pilastra? Será que tá todo mundo vendo essa orgia em que me meti? Socorro!

E o próximo passo foi a apresentação. Nessa hora, eu já queria voltar para o meu padre… Gente, que preguiça ter que falar quem eu sou, o que faço e bababá bububú. No mais, como assim o que eu faço? Como assim o cara vai ter uma ideia de quem eu sou quando eu disser que faço pilates, por exemplo? Faço pudim também. Não sei responder isso e não consigo me explicar em uma frase. Cara, vai ler meu blog, ler minhas resenhas, ver meu lattes, ver meus vídeos, conversar com meus pais, meus alunos, meus filhos… sei lá. Como ele vai saber quem eu sou ou ter uma ideia dessa nuvem trovejante com uma frase? O que dizer numa hora dessas? Mas gente… Eu sou a soma dos quadrados dos catetos, mas pode me chamar de hipotenusa? Fala sério…

Ou então: Temente à Deus fui somente na infância, ao Diabo, nunca. Professora sou somente pelas manhãs e a tarde sinto falta. Escritora serei um dia, doutora não me sinto e flamengo até morrer. Até parece. Dançarina nunca quis ser e caixa de supermercado só quando era criança. Boa aluna quando era bem menor e rebelde fui sem causa. Míope eu sou desde os doze e mocinha também. Por fora, um pouco japonesa; por dentro, completamente negra. Minha força não está na solidão. Preciso sempre ser orientada e jamais busquei a independência. Quando durmo sonho muito. Acordada, muito mais. Quando tomo banho me distraio com o vapor que ofusca o teto e se estou limpa, leio. Não sou como me veem e muito menos o que digo. Sou, agora, aquilo que eu escrevo.

Mandei essa.

Daí o crush: oi?

Aff. Fala sério… O padre teria amado…

E o pior. Recebi três mensagens inbox  no facebook mais ou menos assim: Professora, te vi no Tinder! ahahahahahaah

Ó, senhor, no que fui me meter?

No mais, fiquei pensando… quem sou eu? Em quem me transformei afinal? Isso me perturbou um pouco. Enquanto os crushs estavam alucinados querendo saber se gosto de ir ao cinema, se faço trilha, bato tambor ou fumo, eu ficava matutando na equação escrita quando as rugas ainda não eram residentes no meu rosto, ou seja, no que planejei ser quando eu era muito jovem. O resultado foi muito diferente do esperado. Mas isso pouco importa pois agora entendo que nós não temos o menor acesso aos cálculos dessa equação.

Enfim, não faz o menor sentido sermos medidos pelo que fazemos hoje e sim pelo que sentimos desde sempre. Assim, são as incertezas descomunais e as inquietações colossais que nunca deixaram de existir em mim seja lá para onde eu olho que poderão dar alguma pista de quem sou eu. E isso não tem nada a ver com trabalho e muito menos com o que faço nos fins de semana. Como explicar isso para seja lá quem for? Assim. Do nada? Não consigo….

O Tinder não é, definitivamente, para mim. Nada contra quem o usa. Nada mesmo. É que eu sou chegada a uma apnéia daquelas e ele só permite mergulhos com snorkel. A conta está devidamente apagada. E os vídeos do padre Fábio de Melo falando lindamente bombaram como nunca na minha tela.

Amém.

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