Judas e Jesus no Brasil.

Judas

Aqui no subúrbio carioca, certas tradições saltam aos olhos de quem anda pelas calçadas. No Dia de São Cosme e São Damião, as ruas ficam repletas de crianças pegando doce e é comum ver muitas casas abertas para a entrada livre dessa turba de pequena estatura.

Hoje de manhã fui comprar pão e me assustei com um grupo de crianças e adultos pisoteando um boneco feito de pano e espuma que tinha o tamanho de um ser humano adulto. As crianças batiam na cabeça do boneco com um cabo de vassoura. Lembrei-me que hoje é sábado de Aleluia, dia de acabar com a raça do delator de Jesus: Judas Iscariotes… Fiquei observando o massacre. Ao final, eles penduraram o boneco no poste e a tarde, disseram, vão colocar fogo nele. Cenas do Estado Islâmico em Madureira, minha gente… Só não fotografei porque não ando mais nas ruas portando celular para não ser roubada como já me ocorreu três vezes.

Daí fiquei pensando se com Jesus a coisa ia ser diferente caso ele voltasse nos dias atuais. O que ficou claro é que sendo Judas ou Jesus, Oscar Wilde parece que acertou em cheio quando disse: “Há três tipos de déspotas. Aquele que tiraniza o corpo, aquele que tiraniza a alma e o que tiraniza, ao mesmo tempo, o corpo e a alma. O primeiro é chamado de príncipe, o segundo de papa e o terceiro de povo”.

No subúrbio, eu não sei como o tratariam, mas, pelas ruas do Leblon, dá a impressão que se ele voltasse repetindo o discurso de dois mil anos atrás, ele seria de novo crucificado. Antes disso, seria linchado pela elite raivosa. Jesus não ensinou a pescar porque ele sabia que quem tem fome tem pressa. Ele é daqueles que distribuem o pão e multiplicam o peixe… E quando ele soltasse a célebre frase “É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus”, iriam gritar “Fora PT!”, “comunista!”…

Duvido se Jesus seria a favor da redução da maioridade penal… Gritariam no ouvido dele coisas como ”tá com pena de bandido? Leva para sua casa!”… E não importa se Jesus estivesse na Zona Sul ou por esse subúrbio abandonado por Deus e pelos políticos. Ao começar a falar: “Atire a primeira pedra quem…”, pronto. Nem teria terminado a frase já teria morrido… “seu defensor de bicha!”, “seu sem-terra!”, “seu mendigo!”, “subversivo!”, “quer acabar com a família tradicional brasileira!?”, “defensor de puta!”, “Bolsonaro para presidente!”… e por aí vai…

Jesus, definitivamente, não agradaria os príncipes, nem o papa e muito menos o povo…

Enfim, não importa com quem tu andas e quem tu és. Jesus andava com Judas e este com Jesus e os dois seriam massacrados nas ruas do Brasil do século 21.

Tempos difíceis, minha gente, tempos difíceis…

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