Dia do Professor em 2016.

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Nesse dia do professor, eu gostaria de fazer algumas observações sobre a minha profissão. Primeiramente, fora Temer porque com ele esta profissão está morrendo. Esse governo cujo ministro da Educação recebe em seu gabinete Alexandre Frota e flerta com o projeto Escola Sem Partido que tem como líderes e porta-vozes pessoas altamente conservadoras como Bolsonaros, Felicianos e Malafaias não é um governo que valoriza essa profissão.

O papel do professor está longe de ser o detentor do saber nesse mundo moderno. Qualquer pessoa com acesso à internet tem todas as informações passadas nas escolas há trinta, vinte, dez anos atrás. Não faz o menor sentido o aluno sair de casa para assistir uma aula que esteja disponível no Youtube. Se a nossa aula está no Google, somos mesmos desnecessários. Hoje, temos que estimular nosso aluno a buscar conteúdos, conectar informações e pensar sobre elas. O celular, nesse sentido, não é inimigo e sim uma boa ferramenta nesse processo, vale observar.

O professor do século 21 não pode ser apenas o transmissor de informações, mas sim, e sobretudo, uma elaborador de situações que possibilitem ao sujeito buscar naquilo que já sabe elementos para desvendar o que ainda não sabe. E cai por terra, assim, o professor-guru, o sabe-tudo. O importante em sala de aula passa a ser as interações produzidas entre quem ensina e quem aprende e o aluno agora não é somente “o quem aprende” mas também “o quem ensina”.

Cabe ao professor reconhecer suas limitações, trabalhar em prol do crescimento coletivo, respeitar as diferenças individuais e crescer com seus alunos.

Mas isso tudo, se Temer e seus comparsas permitirem…

Hoje, 15 de Outubro de 2016, ouço ecos do discurso de que o ensino deve formar um cidadão e que ao professor não lhe cabe a tarefa de educar e sim de ensinar. Entende-se por “ensinar” enfiar goela abaixo do aluno conteúdos distantes de sua realidade e domesticá-lo para servir a um sistema que insiste na ideia de que “ser alguém na vida” é um ser que tem muito dinheiro para consumir coisas supérfluas.

Não é sem motivo que sempre são os grandes empresários e administradores (e não educadores em sua essência) que lideram o projeto da escola obrigatória e não é difícil perceber que o modelo de formação industrial como uma linha de montagem é perfeito para ser usado como “boa educação”. Por outro lado, é muito fácil entender o motivo dessa resistência em modificar o papel do professor.

Se há um projeto Escola Sem Partido em andamento cujo discurso vem acompanhado de que os professores fazem uma doutrinação marxista é porque discutir o pluralismo de ideias significa, para esses grandes empresários, uma ameaça, pois implica que a educação pública deva transmitir livremente a ciência e a arte, preparando o educando não somente para desenvolver pensamento crítico, mas também para respeitar a diversidade, a alteridade e a divergência de opiniões que caracterizam as sociedades democráticas. Por incrível que pareça, isso é visto como algo perverso.

Hoje, há professores estimulando o debate sobre a cultura eurocêntrica, o consumismo moderno, a urbanização do mundo, a atuação das empresas multinacionais, a corrida desenvolvimentista, a sustentabilidade e a história contada por pensadores brancos entre outros assuntos marcados pela hegemonia do saber. Questionamos por quê as mulheres são tão agredidas, os negros assassinados, a indignação ainda é tão seletiva, debatemos sobre o sucesso ser baseado unicamente na ascensão econômica, enfim, falamos sobre vários temas conectados a natureza da perversidade das relações. Hoje, há professores estimulando a discussão sobre as desigualdades sociais, o feminismo, a discriminação sexual, entre outros assuntos e isso tem feito o futuro cidadão pensar e, por isso, estamos sendo criticados.

Em pleno 15 de Outubro de 2016, vejo pessoas querendo calar e amordaçar o professor exigindo que ele desempenhe o mesmo papel de 20 anos atrás e lutando para que a escola continue sendo um espaço de conformismo social, cultural e intelectual. Para esses seres que flertam com as ideias fascistas dos Bolsonaros, analisar criticamente as realidades é um problema – já que hoje há vários professores educando para autonomia e para o pensamento crítico.

Eu não sei quanto aos demais colegas, mas eu nada tenho a comemorar no Dia do Professor. O Ensino Público vai piorar, as vagas para as universidades já diminuíram e estamos caminhando para o fim da Universidade Pública gratuita.

Querem nos fazer acreditar que será através dessa “escola pública” que estão nos impondo que vamos tirar as pessoas da pobreza. Se estudarmos o mínimo, veremos que foi com o advento do colonialismo juntamente com o dito “desenvolvimento” e a ideia de “ajuda” que a pobreza foi criada no mundo. Só mudam os atores, os personagens são os mesmos…

Não tem como não citar Paulo Freire no dia de hoje e vou terminar com ele: “Seria uma atitude ingênua esperar que as classes dominantes desenvolvessem uma forma de educação que proporcionasse às classes dominadas perceber as injustiças sociais de maneira crítica”.

Por isso, a animação desses conservadores em calar o professor que se recusa a ser uma marionete desse sistema e que aceita seu novo papel inspirado em escolas de países que são considerados modelos de boa educação.

Vale lembrar, que a luta pela liberdade do professor não é somente nossa e sim de todos que não querem uma sociedade plena de amebas ambulantes e rindo quando chicoteadas.

Ainda que me falte a danada da esperança, continuarei lutando porque não quero passar por esse mundo como alguém que foi amputado sem grito, resistência e  repúdio diante de tanta atrocidade e dor.

2 comentários em “Dia do Professor em 2016.

  1. De tirar o fôlego, seu texto. Não sou professora, mas compartilho cada palavra sua. Parabéns mais uma vez pela lucidez e contundência, precisas e necessárias.

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