Short Movie em plena manhã de segunda-feira.

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Plano fechado. Close no rosto da criança.

– Mãe, você é uma mulher surpreendente mesmo. Cada dia admiro mais sua coragem.

A câmera agora está no rosto da mãe que dá um longo bocejo enquanto dirige.

Imagem do carro estacionando perto da escola.

Na tela, vemos de cima carros parados no sinal e a mãe atravessando calmamente a rua na faixa de pedestre com as mãos dadas com seu filho caçula.

De novo fecha o plano no rosto do menino que está agora na porta da escola.

– O céu para você é o limite, mãe.

Foco na mãe:

– Qualé, Yuki. Que que tá pegando hoje que você não para de me elogiar.

A mãe coça a cabeleira descabelada olhando o céu. Ela está alheia ao mundo.

Close errado no filho:

– Não te elogiei em nenhum momento, mãe. Estou assustado com a sua coragem. É bem diferente. Você me trouxe para a escola de pijama e se supera a cada dia! Amanhã o que será?

Plano americano. Abre o zoom.

A mãe está com calça de moletom, camisa de vereador, meias e havaianas.

– Amanhã venho de girafa.

Vemos, na tela, os ombros do filho e o rosto da mãe de frente para ele se transformar quando ele diz:

– Duvido, mãe.

O filho falou a palavra proibida para a mãe.

A tela vai fechando se aproximando do meu rosto focando em meu olhar sonhador-diabólico terminando com a imagem nítida de uma remela.

 

 

Tá doido, Pipo?

Pipo, meu super mozão que mora em Brasília, depois de 50 anos sem me ver, passou esta semana aqui em casa. É menos trabalhoso montar um quebra cabeça de dez mil peças ou tentar entender como Temer ainda não caiu do que cruzar a minha agenda com a do Pipo. Mas, enfim grazadeus, conseguimos.

Segunda-feira foi lindo. Muita saudade para dar conta.

Terça-feira foi lindo. A segunda não havia sido suficiente.

Quarta-feira foi lindo. Estávamos em festa.

Quinta-feira foi bem bacana. Havia paz dentro da gente.

Sexta-feira. Bem. Sexta-feira…

Na sexta, cheguei do Cefet e fui correndo dar um beijo nele que estava trabalhando compenetrado no computador sentadinho na minha cama.

Olhei de relance o que Pipo estava fazendo e vi uma página aberta do Word quase completa. E ele tec tec tec tec digitando.

– O que está escrevendo, meu amor? – perguntei fofamente.

– História em quadrinhos. – respondeu ele sem tirar os olhos da tela e me mostrando de forma ligeira várias páginas já escritas.

Ôxi! E desde quando se faz textão para escrever história em quadrinhos? Não tinha nem um boneco de pau naquelas laudas! Acha que sou burra é?, pensei sozinha. Pipo estava sendo debochado comigo, concluí sabiamente e rapidamente porque a velocidade do meu raciocínio é impressionante mesmo.

Pra que bicho…

– Olha aqui, seu Pipo Augusto da Silva, deixa de ser grosso. Então é isso é? Entramos tão rápido em outro nível da relação? Já começamos no modus irônicus antes de fazermos um aniversário sequer? Saiu da Asa Norte direto para Madureira para me tratar desse jeito cheio de graça? Tá doido, Pipo? Perdeu a noção?!

Ele olhou para mim e riu.

Fiz o que qualquer pessoa normal faria. Peguei meu travesseiro e taquei na cabeça dele para ele saber que ou responde para mim direito com o respeito que euzinha mereço ou tiro porrada e bomba mais golpes de krav magá que aprendi numa sessão ali na Praça Seca de empoderamento feminino.

Daí, ele calmamente me explicou que roteiro de história em quadrinhos se faz assim mesmo, que vai ser o Welder que vai fazer os desenhos e bababá bububú mais um monte de coisas que eu não sabia dessa área aê.

– Entendi. – falei com a serenidade de um monge do Tibete depois de ter dançado a ragatanga.

Rimos muito da minha reação e, enfim…

Sexta-feira foi lindo também.

Acabo de deixá-lo no aeroporto. Despeço-me com gratidão da pessoa que fez da minha semana um sábado de Sol na Lagoa.

​Carta aberta à professora Marcia Friggi que foi brutalmente agredida por seu aluno de 15 anos:

Querida Marcia,

Sou professora há vinte anos. Lecionei em escolas estaduais, particulares e, hoje, sou uma privilegiada por ser docente do CEFET/RJ. Digo isso porque, na esfera federal, temos condições melhores de trabalho ainda que nada seja definitivo. Enfim, somos colegas de luta.

Dizem por aí que quando uma mãe perde um filho é como se todas as mães enterrassem sua cria. A palavrinha da moda: empatia. A dor é sentida como se fosse nossa por, talvez, ser de todas realmente.

Penso que o mesmo se dá com essa linda profissão. Quando um professor leva um soco, é atingido por uma bala de borracha ou humilhado seja pelo diretor de escola seja pelo nosso próprio aluno, todos nós, educadores, padecemos. Portanto, venho lhe dizer, Marcia: estamos todos dilacerados.

O que achei de suma relevância em sua postagem foi a conjunção “mas” usada no último parágrafo: “Estou dilacerada, mas eu me recupero e vou dedicar a minha vida para que nenhum professor brasileiro passe por isso nunca mais“.

A força de um educador é impressionante e venho aqui hoje dizer que você não está só e podemos juntas fazer muito mais.

Para variar, pergunto-me o que levou o aluno a lhe agredir e como podemos agir para que isso não torne a acontecer com mais nenhum colega, como você mesma desejou.

Sabemos, Marcia, que damos o que recebemos. Li vários comentários em publicações que compartilharam de sua postagem dizendo que faltou a esse jovem “porrada” e “corretivos”.

Fiquei assustada e pensando sobre tudo isso.

Não sei se com violência melhoraremos o mundo e tenho quase absoluta certeza, a despeito do sangue que escorreu pelo seu rosto, de que você, Marcia, não deseja que o agressor seja assim corrigido e acredite que com mais desamor resolveremos esse problema epidêmico da falta de respeito entre os seres humanos no mundo.

Ele não deu um soco só em você. Seu aluno representa um grupo (grande) da sociedade e seu olho, inchado com o golpe recebido, o de todos nós professores. No que pese tamanha aflição que senti ao ver seu sangue, lembrei-me de Gandhi e questionei-me se, ao devolvermos com a mesma moeda essa violência, não terminaremos todos cegos.

No mais, Marcia, os nossos governantes não nos respeitam há tempos. O salário de um professor público da rede municipal e estadual é um insulto. Não escolhemos essa profissão para ficarmos ricos, mas condição de trabalho  digna era o mínimo que deveríamos ter. Nem isso, Marcia, estamos tendo. Há colegas sofrendo de depressão e se matando literalmente por não aguentar a vida que têm levado.

Os pais de muitos de nossos alunos também não nos tratam com o mínimo de educação.

A população não mais se comove com as condições em que se encontram as escolas públicas brasileiras.

O sucateamento do pouco que nos resta da Educação Pública segue a olhos vistos e desejam que acreditemos que isso é destino, ou seja, que nada pode ser mudado.

Quando queremos conscientizar os estudantes de que precisamos repensar a sociedade, diminuir o preconceito e as mazelas do mundo, Marcia, dizem que estamos fazendo doutrinação marxista nas escolas e nos ridicularizam.

Como exigir respeito de um adolescente se todo o resto da sociedade parece que nos abandonou, Marcia?

Punir esse aluno com mais violência talvez o assuste e, por medo, ele aprenda a controlar o ódio dentro dele. Mas pode ser que isso signifique enxugar gelo. Não sei se você concorda comigo já que está sob efeito desse susto. Seja lá o que você sentir e pensar, eu compreenderei.

Para finalizar, Marcia, divido com você a sua indignação e a minha dúvida: em que medida os pontos que você recebeu na sua ferida serão suficientes para fechar e curar o corte que nós, professores, recebemos todo santo dia de nossos governantes e da sociedade?

Conte com meu apoio nessa luta para que isso não mais aconteça com nenhum de nós.

Com carinho.

Elika Takimoto
—–

Segue a postagem da professora contando o triste ocorrido:

https://m.facebook.com/story.php?story_fbid=1420157574727537&id=100001999254929

Eu, Yuki e Charles Aznavour

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Ontem chamei Yuki, meu caçula de dez anos, para mostrar algo para ele.

– Kinho, vem ver aqui uma coisa. Quero te apresentar algo especial. Mas você tem que estar 100% comigo aqui.

– Tô pronto. – disse ele uns minutinhos depois.

Peguei meu celular. Coloquei os fones de ouvido nele. E dei o play em Charles Aznavour cantando Hier Encore.

Yuki, para vocês terem uma ideia, chorou com menos de dois anos quando ouviu pela primeira vez Sailing cantado por Rod Stewart no Rock in Rio. Eu estava assistindo o vídeo com ele ao meu lado e levei um susto com Yukinho em prantos. Quando perguntei por que ele chorava, meu bebê tirou a chupeta da boca e me respondeu:

– A muca, moin, a muca… – querendo dizer que era a música que havia emocionado.

Isso posto, fiquei com ele abraçada nesse momento importante onde somos apresentados a raridades.

Lágrimas mais uma vez.

Ele tirou os fones lentamente.

Silêncio alguns segundos.

– Mãe, que isso mãe… lindo!

Daí me empolguei e mostrei outras coisas do mesmo artista. Depois falei que Aznavour era tipo um Frank Sinatra só que francês.

– Quem é Frank Sinatra? – perguntou ele curioso.

Peguei e mostrei logo o My Way cantado pelo the voice. Sou dessas. Yuki estava só emoção.

Como forma de gratidão, ele me mostrou vários vídeos mega da hora de YouTubers jogando vídeo game hiper difíceis de estratégias e outros contando piadas e várias curiosidades. Amei todos! Ficamos conversando muito depois sobre o que acabamos de conhecer apresentado pelo outro.

É o que canso de falar para eles. Não me tornei mãe para “educar” ninguém e muito menos dizer o que é certo a se fazer nessa vida – já que eu mesma estou perdida nessa bagaça.

Coloquei filho no mundo para trocar ideia.

E como tem sido bom esse escambo com eles…

 

PT? Tem certeza?

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O título dessa postagem é a frase que tenho ouvido com grande frequência depois de ter anunciado a minha filiação ao maior partido de esquerda da América Latina. Mais preocupante do que essa pergunta é o questionamento se eu quero mesmo entrar “para esse meio imundo que é a política”.

No que pese meu reconhecimento aos erros cometidos por vários políticos do PT, pergunto-me, sobretudo, se seria possível viver sem tropeçar e se há, para além do sonho e da utopia, alguma instituição ou um ser humano digno que só tenha acertado em sua história.

Ouvir que o PT  “institucionalizou a corrupção no país” causa uma certa dor. Fico incomodada não por acreditar nisso, mas por perceber o quanto as pessoas ignoram tudo o que o partido fez como, por exemplo, as medidas efetivas para combater a corrupção e as suas causas. Houve nos governos do PT um fortalecimento, sem precedentes na história, das instituições de controle da administração estatal e a promoção intensa a transparência da gestão pública.

E isso não é coisa minha movida pela cegueira que a esperança nos gera. Os próprios procuradores da Lava Jato já reconhecem que foram as políticas criadas pelo PT que permitiram o combate mais duro à corrupção. Ilusão é achar que a Lava Jato teria acontecido em outros governos como do PSDB. Se acreditam que nessa época não havia corrupção era porque imperava o acobertamento dos ilícitos nos gerando a falsa sensação de que não estávamos sendo roubados.

Depois que Lula me ligou por conta de um texto que havia escrito, muita coisa mudou em minha vida. Recebi convites para participar de várias plenárias, reuniões, conhecer melhor os movimentos sociais e até o acampamento do MST. Uma coisa ficou ainda mais certa na minha cabeça desde então: quem diz que na política só há corruptos é por pura ignorância, tomada aqui no sentido real da palavra, por “ignorar” tantas outras histórias e a luta de uma infinidade de gente séria do meio. A verdade não se encontra na televisão e na mídia que é financiada por empresários, vale sempre lembrar.

Esse sentimento de querer distância de política é extremamente perigoso. Quem não gosta de política, já dizia o próprio Lula, paga o preço por ser governado por quem dela se tira muito proveito. Ver jovens sem vontade de se envolver politicamente com causas sociais faz soar em mim um alarme de perigo. Creio que isso dificulta ou quiçá impede uma solução para nossos reais problemas, pois dá mais abertura, como podemos testemunhar, para que políticos que não respeitam a democracia encontrem saídas autoritárias para a crise que envolvem políticas neoliberais aliadas aos interesses do grande capital.

A minha filiação se dá nesse cenário pós-golpe quando vi a soberania popular sendo “subtraída em tenebrosas transações”. O governo que aí está  – e que não seria eleito pelo povo – implementa medidas anti-sociais que terão um efeito longo e devastador principalmente nos campos do meio ambiente, da previdência, da saúde e da educação. Vi a retirada da credibilidade do voto e da política. O barco não está à deriva e sim sob o comando de um grupo guiado por uma mídia oligopolizada, juízes partidarizados e pelo capital.

Todas essas reformas que foram e estão sendo votadas buscam implantar um novo regime, com menos gastos na área social e fortes ataques a direitos conquistados a duras penas pelos trabalhadores, piorando muito as condições de trabalho e tornando aposentadoria do povo brasileiro um sonho.

Não há na história mundial uma superação a algo parecido do que está acontecendo em nosso país sem luta e sem resistência. Ou melhor, sem a retomada de confiança na força da democracia. A minha filiação se dá por acreditar nessa força e por ver políticos sérios combaterem bravamente essa agenda montada para tirar direitos e favorecer ainda mais aos setores rentistas.

Acompanhar tudo isso de perto fez com que eu quisesse participar de forma mais eficaz dessa luta. Quero ajudar a construir não somente dentro do PT mas junto com movimentos sociais, forças progressistas e também com outros partidos de esquerda e centro esquerda uma nova agenda para o Brasil que seja capaz de apontar um rumo para o desenvolvimento com redução da desigualdade. Percebo o grande obstáculo e o tamanho da dificuldade a ser enfrentada. Mas sei que as barreiras não se eternizam se fizermos por onde – e sei também que elas irão se fortalecer se não nos unirmos.

Respondendo a pergunta inicial: sim. PT. Tenho certeza. Como professora percebo que o PT é o meu lugar pois, tal como Madureira, é “cercado de luta e suor e esperança num mundo melhor”. Na Educação que é a minha área, vi somente nos governos do PT a criação de 18 universidades públicas e o orçamento do Ministério da Educação passar de 18 bilhões, em 2002, para 115,7 bilhões, em 2014.  Além disso, mais de um milhão de alunos tiveram acesso a bolsas integrais e parciais de estudos do Programa Universidade para Todos (Prouni) e quase três milhões de alunos se matricularam em universidades por meio do Sistema de Seleção Unificado (Sisu), em 2015. O número de escolas técnicas passou de 11, durante o governo FHC, para 420 unidades! E mais de 12 milhões de jovens foram matriculados no Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). Foi bonito acompanhar tudo isso.

Finalizando: a filiação ao partido que nasceu no mesmo dia que eu (10 de fevereiro) acontecer no subúrbio carioca, na quadra do Império Serrano, em Madureira, bairro em que moro há mais de quarenta anos, tem uma simbologia imensa em minha vida. Receber a benção de meu presidente nesse dia será uma honra e tanto.

Não tem como não dar samba tudo isso, gente.