Viajando com Isaac

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Estou morta de cansaço, mas quero compartilhar algo ímpar que aconteceu hoje em minha vida.

Muitos já sabem que o espetáculo Isaac no mundo das partículas está novamente em cartaz. Desta vez, porém, o financiamento foi via benfeitoria, ou seja, conseguimos reestrear com a colaboração de muitas pessoas.

O que vocês não sabem é o quanto trabalhamos para alcançar a meta. Cada um de nós forneceu e produziu o que podia para ajudar nas recompensas. Por exemplo, a Joana Lebreiro, diretora do espetáculo, ofereceu aulas de teatro com ela para quem contribuísse com uma determinada quantia. Fizemos botons, CDs, chaveiros e vídeos de agradecimento. Eu, particularmente, ofereci meus livros autografados e… aí que quero chegar, palestras para escolas sobre Física de Partículas.

Nunca dei aula para crianças. Não sei dar bom dia para mais de cinco delas juntas. Tenho medo de parecer apresentadora de programa infantil. Escrevi um livro para a molecada mirim baseado nos diálogos que tive com Yuki. E só.

Pois não é que contribuíram lá com um tanto no financiamento coletivo para receberem a palestra nas escolas? E agora?!

Comigo é tudo assim. Não penso. Vou fazendo, vou oferecendo coisas no calor das ideias e quando vejo tô desesperada com um desafio enorme pela frente.

Vou dizer o que aconteceu. Peguei todos os livros que tinha sobre o tema. Reli várias passagens. Refiz várias contas para aquecer os neurônios. Separei fotos do CERN, montei os slides tudo em sequência cronológica. Lindinho. Coloquei ilustrações do livro do Isaac para embelezar a palestra. Estou há umas duas semanas fazendo isso. Ontem à noite terminei. Ufa! Em tempo.

A palestra foi hoje pela manhã no CEAT em Santa Teresa.

Acordei três e meia da madrugada. E não dormi mais. Fiquei pensando nos slides, no livro, nas metodologias tradicionais que massacram a criança de informação que elas não querem saber.

E pensei no quanto a curiosidade move um cientista.

Mudei tudo.

Decidi não usar nada que levei dias preparando.

Às onze da manhã estava diante uma turma de uns 50 alunos com idade em torno de dez anos. Apavorada como ficam todos que vão fazer algo que não tem a menor ideia no que vai dar.

– Bom dia. Meu nome é Elika Takimoto. Vim aqui dar uma palestra. Mas não vou falar nada a não ser que seja perguntada. Só darei a primeira informação. Se vocês não perguntarem nada, eu muda ficarei. Meu nome é Elika, sou professora de Física e fiz um curso de Física de Partículas no maior laboratório de física do mundo.

Pronto. Me calei.

Umas oito crianças levantaram a mão.

– O que é física?
– Esse laboratório fica onde?
– O que se estuda lá?
– Física de Partículas? Tem outros tipos de física? Por que a divisão da física?

Respondi todas as questões. E a cada resposta mais crianças sinalizavam que queriam participar.

E assim, por uma hora e meia, tive várias pessoinhas me bombardeando com pontos de interrogação. Falamos sobre Big Bang, sobre a origem da massa, sobre Física Quântica, sobre a natureza da luz, sobre buracos negros, sobre a relatividade de Einstein, sobre Deus, sobre espaço e tempo e sobre o espaço-tempo, enfim, sobre Ciência sem rodeios.

Tive que interromper e sinalizar que a palestra estava terminando. Ao final, deixei claro para as crianças que todas as perguntas que elas me fizeram foram feitas pelos maiores cientistas que já passaram pela Terra e várias delas ainda estão sendo respondidas lá no CERN, o maior laboratório de física do mundo.

Provoquei dizendo que muitos dos que lá estavam hoje conversando comigo, pela profundidade das perguntas, podem ser os cientistas que irão responder às principais questões que estão hoje em aberto.

Não subestimei meu público. Não tive dedos em tocar em nenhum assunto e fiz questão de mostrar que a ciência é um conhecimento extremamente poderoso e perigoso porque pode transformar o mundo ou acabar com ele. Daí a necessidade de entendermos minimamente do que se trata e não ter medo das equações, pois elas são frases como uma outra qualquer.

A física quântica sequer é ensinada no Ensino Médio e hoje tive uma turma de crianças alucinadas por querer saber mais sobre o assunto. Orientei como eles iam continuar pesquisando na internet e alertei sobre a quantidade de informações erradas que temos nas redes.

Era isso que queria compartilhar antes que meu dia acabasse. Estou extremamente feliz e morta de cansaço. Só não sei se sonharei mais quando dormir ou agora em que vislumbro um mundo onde todas as crianças sintam prazer em aprender e entendam que crescemos muito mais nas dúvidas do que nas certezas.

Jamais pensei quando escrevi Isaac no mundo das partículas que iria tão longe dentro da nave do meu personagem.

Gratidão eterna para Joana Lebreiro e Camila Vidal (diretora e produtora do espetáculo) que vivem reabastecendo o meu foguete.

5 comentários em “Viajando com Isaac

  1. Que lindo Elika!! Dá para perceber o que a Janete falou, que você pega aluno sem base e os transforma. Parabéns pela professora que você é. Aliás parabéns pela professora, palestrante, escritora e por ser um exemplo de coragem. Você com certeza nao só está no lugar certo, como qualquer lugar fica certo com você. Que Deus te ilumine sempre. Todo o meu carinho e admiração. Beijos!

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  2. Tô chegando agora por aqui e já amei de cara! Parabéns, Elika! Conhecimento, sensibilidade e respeito pelos alunos! Grande comunicadora! Espero que sua vida seja longa e cada vez mais significativa! Abração!

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  3. Adorei seu depoimento. A escola tem um poder fascinante, vezes encoberto por camadas de comodismo, outras por falta de conhecimento ou compartilhamento. Parabéns. Tive excelentes professores de física, aqui em Jundiaí, amigos meus depois, meus companheiros João Batista e Gualter. Mas nunca entendi muito. Mas, o meu gosto por leitura veio com um primeiro livro “obrigatório”, com a cara das crianças, que era A Ilha Perdida. Como é importante abrir portas pelo prazer, pela curiosidade. Um graaaaande abraço.

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  4. Maravilhosa sua aula, Elika! Sem interesse genuíno e sem “emoção” por parte dos alunos, não se aprende de verdade. Vale especialmente para crianças e adolescentes, mas vale para adultos também. Bjs

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