Takashi keiko kurama, Beth Carvalho

beth

Eu tenho uma história com a Beth Carvalho que me lembrei agora e gostaria de compartilhar com vocês. Não me orgulho do que irei contar mas, preciso confessar, não me arrependo de nada.

No Teatro Rival, no Centro do Rio, de 15 em 15 dias, às segundas, acontecia o Pagode do Arlindo com vários convidados. Eu, Nelson (meu marido na época) e um grupo de amigos não perdíamos um show sequer. Já tínhamos mesa cativa. Haja amor pelo samba. Chegava em Madureira para lá de meia noite para às sete da manhã no dia seguinte estar em pé dando aula…

Por conta dessa frequência, fomos até chamados para ir no batizado dos filhos do Arlindo. Vejam vocês a simpatia desses sambistas. Onde comem cinco comem duzentos e cinquenta.

Um dia a convidada da noite era Beth Carvalho. Nunca tinha visto a rainha pessoalmente. Que me perdoe a Teresa Cristina que fez um duelo com ela naquela segunda. Beth, mais baixa do que eu, dominou o palco. Fiquei assustada com tamanha energia. Nem consegui sambar. Sentei-me e fiquei boquiaberta admirando tamanha estrela.

Ao final do show, sempre íamos para o camarim dar um tchau para o Arlindo que já nos conhecia. Quando chegamos lá, vi Beth sentada no sofá.

Fiquei eufórica querendo ir até ela, tirar foto, dizer que ela é maravilhosa, tietar, abraçar, cantar um refrão alto, destilar toda o meu contentamento. Essas coisas de quem abre os braços naturalmente diante de uma beleza natural.

Nelson me freou. Disse que pegava mal esse tipo de comportamento naquele ambiente ali cheio de artistas. Os amigos concordaram que eu tinha que ficar quieta e deixá-la em paz.

Aceitei me controlar pelo bem do social.

Depois tive uma ideia.

– Vou lá falar com ela e ela vai se empolgar com o que vou dizer. Não vou fazer feio, podem ficar tranquilos. Vou conversar bonitinha e ela vai ficar super feliz com o que vou dizer.

– Mas o que você vai falar que ela? , perguntou um lá assustado com a minha firmeza.

– Observem, sussurrei para os amigos.

E dito isso, caminhei em direção ao sofá no qual a diva estava sentada. Pedi dálissença porque sou educada perguntando se podia falar dois minutos com ela.

Simpática, Beth Carvalho se mostrou disposta a me ouvir.

Abaixei-me ficando de costas para meus amigos e com os olhos escaneando aquela belezura de cabelos vermelhos.

Meus amigos viram o rosto da madrinha vibrar com o que estava falando. Testemunharam o nascimento do sorriso da Beth ao ouvir minha primeira frase.

Depois, falei mais e ela ficou mais eufórica ainda e desatou a falar a beça comigo super empolgada. Terminado o assunto, demos um abraço. Me coloquei ereta, virei-me e voltei para perto dos amigos que não estavam entendendo nada.

– Mas que diabos você falou para ela?

Antes de continuar, preciso repetir que eu não me orgulho dessa história mas que não me arrependo de nada.

Eu precisava falar que ela era maravilhosa até no Japão.

–  Beth, queria te contar uma. – falei como se fôssemos íntimas – Meus primos no Japão são loucos por você. Acredita que tive que mandar para lá vários CDs seus para eles?

– Menina, os japoneses me adoram! Eu não sei que química é essa que eu tenho com eles! –  Ela disse super feliz e com os olhos brilhando.

– Pois é, Beth. Qual o nome do lugar que você se apresentou lá mesmo?

Não tinha ideia de que ela havia conhecido o Japão. Chutei. Para Beth Carvalho ter falado que tem química com os japas só pode ter sido porque deu show lá.

Assim pensei.

Bingo.

Beth falou um nome que eu, óbvio, me esqueci e que nunca tinha ouvido falar porque do Japão só conheço Tóquio, Hiroshima e Nagasaki pelas revistas e jornais. Mas foi a deixa para eu compartilhar um pouco mais dos minutos com ela.

–  Então. Era esse mesmo! Fica ao lado da comunidade Hironaka que é um local bem interessante só formado de músicos e artistas de teatro basicamente…

Abre parênteses:

Sempre tive essa mania de dizer que sei falar japonês para quem me pergunta. Daí a pessoa fala: “Então diz aí alguma coisa aê” e eu falo o nome de vários primos bem rápido. Como “em terra de cego quem tem um olho é rei”, dou a tradução que der na telha e saio como a poliglota-bilíngue-meodeos-como-ela-é-inteligente.

No caso citado com a Beth Carvalho, eu misturei Hiroshi com Tanaka e voilá a vila Hironaka localizada somente nas profundezas do meu cérebro.

Fecha parênteses.

– Mas você nem sabe, Beth. Tive que comprar CDs com uma música em especial que eles ficaram doidos!

– Sei! Coisinha do pai! Eles amam!

–  Errou. Saigon. Eles, da comunidade Hironaka são loucos por Saigon. Comprei três coletâneas suas onde aparece essa música para eles. Parece que eles vão tentar regravá-la.

–  Mas que interessante! E eles…, ela me contou vários momentos do show onde o público amarelo se deleitou.

Estava em alfa já imersa naquela  história toda. Não me lembro mais o que inventei. Sei que ela ficou feliz e surpresa com a galera Hironaka. Mandou beijo para todos de lá. Me despedi de um jeito oriental dizendo: Takashi keiko kurama, Beth. Ela me puxou e me deu um abraço forte de despedida.

Essa não foi a única vez que a vi ao vivo.

Houve mais uma.

Em Agosto de 2018, eu, em plena campanha, me encontrei de novo com ela. Eu estava em pé na plateia formada por uma multidão. Beth estava sentada, mas não em um sofá. A  dona da voz mais linda do samba estava acomodada numa cadeira de rodas, no palco com o microfone na mão e cantando.

Cantou não só com alegria e aquela energia firme dos que acreditam, mas também com esperança (esse sentimento que, hoje, nos faz levantar para trabalhar em plena Era Bozo):

“O povo quer, o povo decide, o povo diz, nós queremos Lula andando livre no país”.

Foi no festival Lula Livre. Estávamos de vermelho e tínhamos a vontade bonita que as crianças têm de abrir a porta da gaiola para passarinho realizar sua essência que é trazer para a gente a primavera.

Chorei pela emoção de vê-la cantando e por Beth Carvalho, essa gigante conhecida no mundo todo como pude confirmar, estar ao nosso lado nesse momento tão dolorido.

Pelo sua libertação ontem, acabei me lembrando dessa história e tive vontade de compartilhar com vocês.

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