A pressa é inimiga da eleição

Em um dia daqueles que a gente tinha cheio de pressa, uma amiga professora estava toda enrolada. Saiu um pouco atrasada de casa para o trabalho. Viu o ônibus parado no ponto. Disparou correndo para alcançá-lo. Levou um tombo daqueles. Rasgou a calça no joelho, sujou a blusa, bagunçou o penteado e borrou toda a maquiagem.

Eram seis e meia da manhã e ela daria aula o dia todo.

Sarita poderia ter voltado para casa, trocado de roupa e ter recomeçado a manhã aceitando o atraso.

Mas não.

Decidiu passar o dia naquele estado deplorável para não se esquecer de que não é necessário correr para chegar.

Se Sarita tivesse andado, não teria caído, não teria quase sido atropelada, não teria se machucado e teria chegado do mesmo jeito.

Eu não sei para onde estou indo mas, preciso confessar para vocês, andava com uma certa pressa.

Pressa da vacina.

Pressa de que as mentiras acabem.

Pressa para ver a justiça sendo feita.

Pressa para que os profissionais de saúde sejam valorizados e trabalhem com condições mínimas de segurança.

Pressa que entendam que não se educa de forma presencial desprezando a ciência.

Pressa de um impeachment.

Pressa em saber quem mandou matar Marielle.

Pressa em conhecer Francisco, neném de Carol e Daniel.

Pressa em cuidar das pessoas em situação de rua.

Pressa em passar logo por essa transição capilar.

Pressa em ouvir outras dores para além das minhas.

Pressa para entender melhor nossa cidade.

Pressa para cozinhar o feijão.

Pressa para ver o fim da intervenção no CEFET/RJ e nos IFRN e IFSC.

Pressa em escrever outro livro e estender a roupa na corda.

Pressa em falar meu nome, meus sonhos, meu número.

Daí, sem correr, padeci. Não rasguei a minha roupa e nem caí no meio da rua como a Sarita e tantas outras que ensinam e são ensinadas.

Mas doeu forte, no peito. A pressão subiu muito. O coração apertou.

Os exames seguem sendo feitos aqui para descartar qualquer dano no coração. O ecocardiograma deu normal. O médico acaba de me perguntar se tive algum aborrecimento ultimamente. Respondi que desde 2016 ando sofrendo demais.

Talvez você precise ser internada hoje, ele falou.

Independente do resultado, a doença já está dada: seu nome é Brasil.

A cura é o tempo.

Não há de ser nada grave comigo. No entanto, vou publicar essa foto assim como Sarita que deu aula depois de ter beijado o asfalto.

Preciso me lembrar de que outros ônibus virão e que devagar, como sempre andei, também se chega onde mais se espera.

3 comentários em “A pressa é inimiga da eleição

  1. Realmente, a pressa, fruto da ansiedade, não é boa companheira e nesse momento estamos todos ansiosos! Desejo sua plena recuperação e volta rápida às suas diversas atividades!
    Beijo e boa sorte!

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