Entre o céu e a terra plana.

É bem interessante esse processo de ver como somos naturalmente. Eu disse interessante. Não, indolor.

O processo de transição é lento e, dentro dele, cabem dezenas de TPMs. Não sinto vontade de pintar essa juba grisalha. Vivo um tipo de liberdade. Mas, confesso, preciso focar no presente quando me olho no espelho e parar de lamentar por não viver mais em um pretérito que, verdade seja dita, também foi imperfeito.

Pareço que estou feliz sorrindo nesta foto mas estou só respirando um pouco de gerânio.

Dar aula remota é como ir à praia e não poder sequer molhar os pés no mar. Há uma imensidão de sensações na sua frente, tão perto, mas você não pode se mover. Algo invisível te segura. Tipo um vírus.

Esse tipo de coisa não tem ajudado. Entre o céu e a terra plana, há um ar contaminado.

Ficar muito tempo em casa me confundiu. Usei muito pijama e pouco o pente. Não sabia o que era tristeza pelo Brasil, descuido comigo, saudade do Lula, ansiedade por vacina ou herança de uma cultura opressora. Muita dor para lidar desnorteia a gente mesmo.

Quando mostro para o Pipo os meus cabelos brancos rebeldes, ele não entende o que estou falando.

Não sei se isso deveria importar tanto, mas Pipo me olha como se me visse. Ele sorri sempre como fazem os que se encontram.

A transição não é só nos cabelos. Aceitar-se é algo que estou aprendendo. Dói um tanto. Mas meu Deus como as metamorfoses são interessantes.

4 comentários em “Entre o céu e a terra plana.

  1. Elika, vc é um exemplo pra mim. E na foto, vc está linda. Continue firme em sua transição. Espero que, a cada dia, com menos dor.

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