Arrumando a casa

Tudo em seu Devido Lugar

Hoje resolvi arrumar a casa. Coisa que nunca faço porque sempre tem algo melhor a se fazer, tipo dessarrumá-la mais ainda. Comecei pelo quarto dos meninos.  Aqui em casa, Yuki de 9 anos divide o quarto com Hideo de 22.  As baquetas de bateria do Yuki estavam em cima da guitarra do Hideo que estava na cama do Yuki repletas também de gibi da Mônica, livros do Ziraldo e CDs de bandas de rock que não consigo guardar o nome. Não sei de quem é o quê. Como dormiram hoje com tanta coisa em cima da cama? Ou depois que acordaram jogaram tudo em cima dela? Não entendo. Pela mesa, a dúvida persiste. Encontro partituras e desenhos feitos à mão do Angry Birds que não consigo identificar qual dos dois os fez. Os chinelos tanto do Super Homem quanto do Incrível Hulk virados de cabeça para baixo. Esses garotos querem me matar, pensei.

Desisto.

Vou para o quarto da Nara, minha filha linda que adolesce. Flores murchas em garrafinhas de água vazias nas janelas. Sei que não posso mexer. Ela gosta dessas coisas que mesmo depois de mortas têm uma forma própria e carregam história. Esmaltes em cima das letras de música do CD de Elis. Não entendo como ela lia enquanto mudava a cor de suas unhas. Rabiscos de química misturados com croqui de alguma coisa podendo ser qualquer coisa. Há vários gibis da Turma da Mônica Jovem na estante do quarto dela misturados aos livros lidos como os de Mishima e Rubem Fonseca. Não sei se estão em ordem cronológica de leitura. Maquiagem no meio das teclas do piano. Estaria ela solfejando um batom? Ou queria ela achar o tom das sombras?

Desisto.

Vou para meu escritório. É tempo de colocar ordem nessa budega. O livro de física segue mantido aberto por um menorzinho há meses: o Livro das Perguntas de Pablo Neruda. Poética a imagem. Ao invés de separá-los, peguei a máquina (Cadê ela? Ah ali!  Ao lado das folhas de papel ofício) e fotografei. Onde estava com a cabeça em deixar na mesma mesa Em busca do Tempo Perdido de Marcel Proust, 1984 de George Orwell e Vozes Anoitecidas de Mia Couto? O que Ítalo Calvino faz embaixo dos rascunhos? Caramba… que livro lindo esse do Calvino. Dei uma folheada e li quase metade dele. Fechei, levantei as folhas de rascunho (onde tenho algumas ideias anotadas de futuras crônicas) e coloquei Calvino na mesa. Cobri-o com meus repentes de novo. O bom de se esquecer das coisas é que posso fazer surpresas para mim no futuro. Não vejo a hora de encontrar Calvino de novo no susto. Por que Esconderijos do Tempo de Mário Quintana está junto de meus diários de classe? Que livro é esse dele que não me lembro? Nossa. Que lindo… li todo de novo. Levantei Felicidade Clandestina de Clarice Lispector na quina da mesa e vi três multas. Coloquei Lispector rápido de novo onde estava para acabar com aquela visão do inferno que me deu até taquicardia. Cartão de crédito bloqueado para desbloquear, caixa de chocolate em forma de livro que ganhei da Alice e dentro dela… nada. Comi tudo. Coloquei o cartão bloqueado dentro de onde estavam deliciosos bombons e deixei tudo como estava. Gosto de lembrar da Alice.

Desisto.

Fui para meu quarto. Lá, na minha cama, nos reunimos todos para conversar. Livro de fábulas, blusa usada com cecê  da Nara que chega se despindo e deitando ao meu lado, meia chulezenta do Hideo embaixo do meu lençol, pijaminha de hot whels do Yuki e minha camisolinha da Pepa foram todos para seu destino certo: espremidos ali no canto pórque daqui a pouco vamos usar de novo. As roupas sujas foram para o cesto onde encontrei um cinto que Hideo há tempos procurava. No banheiro, na pia, vejo meu caderno de anotações. Não entendo como foi parar ali, mas abro para conferir. Notas de reuniões do grupo de pesquisa em Filosofia com aulas de Física Quântica. No cantinho está escrito: paixão melhor nutella, se não nutella como sabella?

Desisto.

Parei de arrumar a casa e vim aqui escrever essa crônica.

Caixa de Bombons

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Ontem a noite, em plena terça-feira depois de minha aulinha bombadésima de dança de salão na Tijuca, fui pegar Nara e Hideo, meus filhos de 17 e 22 aninhos, na Freguesia onde eles estavam ensaiando para a peça que entra em cartaz no próximo final de semana “Cabaré Opus305”. Vale observar que em 2015, depois do término de um casamento de mais de vinte anos com meu primeiro namorado, passei por uma crise de depressão que me imobilizou durante quase seis meses e a dança de salão foi usada como remédio. Super funcionou. Agora tenho um novo grupo de amigos, já consegui ir ao cinema sozinha pela primeira vez na vida e tenho feito o que der na telha. Sair ou ficar em casa são coisas que atualmente faço em paz. Povoei, enfim, o meu deserto.

Pelo fato de eu ter me reerguido e voltado a viver com alegria, novidades andam acontecendo. Pessoas têm se aproximado e eu tenho permitido. Enquanto estava me sentindo extremamente só, evitei ao máximo qualquer tipo de contato, principalmente com homens. Viver a dor da solidão foi necessário e eu sabia disso. Caso contrário, ia cometer a mancada de sair por aí buscando alguém que me complete, a famosa outra metade, e acredito que para viver a dois, antes, temos que ser um inteiro.

Isso posto ainda que de forma extremamente resumida, ontem ganhei uma caixa de bombons e, voltando ao primeiro parágrafo e conectando as histórias, assim que Nara e Hideo entraram no carro, eu mostrei para eles o regalo toda feliz e contente.

– Vejam! Vejam! O crush está se chegando esbanjando fofura!

– Qual deles? – perguntou Nara que é giga antenada com tudo o que acontece comigo. – O que nasceu em 20 de janeiro ou 19 de Fevereiro?

Nara agora anda nessa de astrologia para meu total desgosto. Eu, como amante de física e ciências em geral, chegada a uma lógica e a uma coerência, abomino qualquer religião. Imagina se euzinha aqui mega inteligente vou aceitar a ideia de que meu comportamento pode ser moldado pela posição dos planetas… Aff. Mas história que segue:

– O que nasceu 20 de Janeiro às 10:40h da noite com ascendente em Aquário.- respondi.

– Você sabe que os capricornianos com esse ascendente são meio desapegados, não?

– Nara, perceba a fofurice. Ganhei bombons agora pouco e durante o dia ganhei coraçãozão no uátisápi. E todo mundo sabe que emoticon de coraçãozão é para começar a escolher a decoração da igreja.

– Mãe, precisamos conversar. Chegou a hora de termos um papo reto. Conversa séria. – disse Nara com um tom hiper assustador.

– Pode falar.

– Os homens costumam se aproximar da gente quando querem sexo. Fazem gracejos, dão bombons, flores, mas eles querem sexo, ok? Essa história de príncipe encantado não existe, certo? Isso é conto de fadas, mãe. A realidade é outra!, você está me entendendo?

– Nara, nem todos os homens são assim, minha filha. – expliquei para ela olhando para o céu estrelado pela janela do carro.

– Mãe, caraca!, me ouve. Depois você vai sofrer e vir para mim toda bagação. Ouve a sua filha que tem mais experiência que você. Sua vida, mãe, está apenas começando e eu tenho a obrigação de abrir os seus olhos!

– Mas, Nara, ele tem sido tão atencioso…

– Claro que sim, mas que fique claro o motivo! Daí, se você quiser ir aos finalmentes tudo bem. Mas não vai iludida pelamordedeos!

– Minha mãe não faz sexo, Nara! – gritou, de repente,  Hideo que estava dirigindo.- Minha mãe é uma santa! Parem com essa conversa que eu vou surtar e eu não tenho dinheiro para terapia! Minha mãe não faz essas coisas! E mudem de assunto que eu quero falar algo importante com vocês. Mudem de assunto!!!!

– Pera que ainda não terminei com ela. – interrompeu Nara cheia de atitude – Mãe, e embora eu saiba que você tenha as trompas ligadas, você tem que usar camisinha. Você vai me prometer que vai usar camisinha. Não se iluda com o perfume dele e nem se ele sair do chuveiro para cima de você com cheirinho de sabonete!

– Ai que eu vou surtar com essa conversa! Nara, minha mãe não precisa desses conselhos! Minha mãe não vai passar por isso!!! – urrava Hideo. – Né, mãe?

– Hideo, cala a boca! – salvou-me Nara. – Mãe, ouve: você não se iluda com homem cheiroso, está me entendendo? Você não sabe por onde ele andou!!! Doença sexualmente transmissível não é brincadeira.  Você para com essa mania de ficar sonhando, por favor! DST é uma realidade que temos que encarar nesse mundo que você está entrando!

– Que entrando, Nara! Só ganhei uns bombons e estou feliz. Só isso!

– Ai meodeos, mãe!, não é só isso!!! Onde foi que eu errei com você que você não consegue enxergar as coisas mesmo eu sendo clara???  Promete pelo menos para mim que vai ficar esperta?

– Ok. Prometo. Pode falar agora, Hideo.- cortei para o Hideo já que estava ficando desconcertada com aquela conversa.

– É o seguinte – começou ele animado – pintou uma oportunidade de eu transar na sexta mas eu preciso que você me empreste o carro para isso. – explicou assim o problema com a maior naturalidade.

Mas gente… antes de eu ter filhos, eu li tudo quanto é revista de psicologia para ser uma boa mãe, aprender como dialogar com eles e bababá bububú. Mas nenhuma tinha esses exemplos especificamente ou nada parecido para eu usar como um guia. Estava tontinha da Silva Takimoto.

– Pode ficar com meu carro, meu filho. – falei pensando na logística de todos nós. – Conte comigo. – disse fofa fofa fofa super mãe miga, descolada e moderninha.

Mas pequei como sempre tagarelando muito mais do que devo:

– O rapaizinho dos bombons vai me pegar em casa na sexta para passearmos.

– Ah não, mãe! Ah não! Promete que não vai ceder para eu poder sair sem crise de consciência! Promete, mãezinha. – implorou Hideo com cara de desespero.

– Mãe, se joga! – disse Nara.

Enfim, eu não sei exatamente o que ando fazendo em relação aos meus filhos. Não sei se posso chamar isso que eles andam recebendo de mim de educação. Dá a entender, quando comparo por aí com outros lares, que o bagulho aqui tem outro nome. Mas uma coisa é certa: não há calça legue que seja mais sincera que a nossa amizade e muito menos parque de diversão que se equipare com o que construí com eles aqui.

E quanto a caixa de bombons que recebi…  Que tudo seja tão surpreendente quanto ela que me fez virar os zóio a cada mordida.

*-*

Procrastinação a Dois.

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– Mãe, você vai correr? – perguntou Hideo, meu filho de 22 anos que está querendo emagrecer, no finalzim da tarde de sexta.
– Vou. Vamos?
– Vamos. – e se deitou ao meu lado.
– Ué. Vamos!
– No três a gente levanta. Pode ser?
– Pode.
– Um, dois…
– Pera. Vai até 13 que eu tenho que pensar numa coisa aqui.
– … 10, 11… Mãe, e se a gente for para o Resenha tomar um chopp com meus amigos?
– Pode ser depois da corrida?
– Ok. Pode. No três a gente levanta então.
– tá.

Me levantei e liguei o ar. Deitei de novo.

– Mãe, por que você ligou o ar? Eu já vou começar a contar até três!
– Escureceu. Será que correr no escuro é bom?
– Mãe, tem luz nos postes. No três, mãe.
– Bora então! Começa logo a contar.
– Mãe, será que não vai ficar muito tarde para depois a gente sair pro chopp?
– Correr de barriga cheia faz mal, né?
– Ué. A gente não ia correr antes?
– Então. De barriga vazia deve ser até pior.

Mas gente…

Moral da História: Quando dois não querem um não faz.

Partiu buteco com filho.

Filhos que não me obedecem: uma dádiva por mim conquistada.

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A imagem do filho obedecendo os pais sempre foi, para mim, um exemplo a não ser seguido. Não sei se faço certo ou errado, mas muitas pessoas têm me perguntado como consegui essa relação de cumplicidade e amizade com meus três filhos que têm idades completamente diferente (hoje, Yuki está com 9 anos, Nara com 17 e Hideo com 22). Pelo fato da pergunta estar se repetindo, resolvi pensar na educação que dei a eles e concluí que eu jamais me importei ou precisei exigir que eles me respeitassem ou obedecessem.

O verbo obedecer significa “ato pelo qual alguém se conforma com ordens recebidas. Autoridade, mando, domínio. Sinônimo de submissão.” Deus me livre… Se o que se busca é respeito, penso eu que isso só é conseguido se o outro lado for respeitado também. Assim como faço com qualquer pessoa, respeito meus filhos e as opiniões deles em tudo. Como mãe, fico atenta às habilidades a serem exploradas, às vontades a serem aprofundadas, ao talento – seja lá para o que for – que pode aparecer a qualquer momento e precisar de um empurrãozinho para emergir.

Não quero que filho nenhum me obedeça. Não me sinto apta a comandar a minha vida quanto mais a dos meus filhos. Se eles tiverem que me obedecer é porque, de alguma forma, assim penso, eles foram podados ou castrados por mim e devem agir de acordo com os meus interesses. Eu passo ser autoridade se tiver que impor a minha vontade e fujo disso já que abomino qualquer tipo de autoritarismo. Filho meu não “tem que” me respeitar e muito menos me obedecer.

Quero que meus filhos tenham luz própria e não sejam sombras de outras pessoas muito menos de mim. Quero que eles sejam eles mesmos, reconheçam as suas vontades e tenham em mim um apoio para conseguir segui-las. As decisões são deles. “Mãe, posso…?” sempre busquei trocar por “Mãe, quero…”. Eu apenas pondero alguma coisa que acho relevante observar, mas as rédeas estão com eles. Quer matar aula, mata. Quer fumar, fuma. Quer fazer teatro, faça. Quer vender arte na praia, venda.

Como disse, não sei se faço certo ou errado, eu simplesmente não consigo agir diferente por aqui. Sei que operando assim tenho, de fato, construído uma relação que muitos têm elogiado. Vale observar que aqui vira e mexe a casa cai. Discussões homéricas são comuns nesse teto, mas nada que em algumas horas tudo volte ao normal. Não é novidade que existe uma quantidade exorbitante de jovens que se drogam. Pelo que afirmam os especialistas da área, muitos desses têm algum problema de relacionamento com os pais que exigem, de uma forma ou outra, obediência. Daí que esses meninos são praticamente forçados a seguir uma determinada profissão certamente pela questão financeira, proibidos de atender aos seus instintos e compelidos a adiar seus sonhos. Seus planos vão ficar a espera de um momento ideal para colocá-los em prática quando saírem da casa dos pais. A solução para esse inferno: as drogas. Isso posto e observado, penso que mesmo que transformemos nossa casa em um ringue de luta quando brigamos – coloquemos assim –  de igual para igual,  filho meu se um dia se drogar não vai ser por minha causa. Disso eu tenho total certeza. Não estou podando a asa de ninguém, pelo contrário, aqui eu só encorajo o voo. Não quero que eles andem no trilho, quero que eles percebam sempre que podem ir para qualquer lugar – como um trem descarrilado –  com o meu apoio.

Então, eu acho que pelo fato de permitir que eles sigam as suas próprias vontades e de criar um ambiente de condições favoráveis e saudáveis para que isso ocorra, acabo conquistando o tal do respeito sem, contudo, ser autoritária e, muito menos, fazer deles seres obedientes. Penso que o dia que  meus filhos se comportarem bem por medo e não por vontade própria eu terei falhado como mãe.

Pela última vez, não sei se estou certa ou errada. Mas uma coisa é fato: não há parque de diversão que se equipare com o que construí com Yuki, Nara e Hideo.

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Vida Privada

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Hideo, meu filho guitarrista e trabalhador, há dias está boladaço com uma casa que ele foi dar aula particular. Na verdade, era um apartamento e bem pequeno. Em um determinado momento, meu filho pediu para ir ao banheiro que era dentro do quarto onde estava a esposa do aluno dele. A esposa estava vestida e coisa e tal, mas continuou no quarto enquanto ele entrou no banheiro. Qual foi o desespero de Hideo ao perceber que não havia porta alguma. Como eles cagam, gente? Um fica olhando o outro? Como pode banheiro não ter porta??? A mulher não vai sair dali? Como assim? Eles são loucos?, repetia essas perguntas que lhe ocorreram na hora para toooooodos que ele contava e recontava a história.

Acabou que, após muito se concentrar, ele fez um xixizão com mulher do cara ali ao lado, depois pediu dá licença para ela e voltou a dar aula achando aquele povo da casa muito estranho.

Ontem, ele contou essa história pela milionésima vez mas pela primeira vez para meu irmão que conhece o tal do cara que vive em um micro apartamento que nem porta no banheiro tem.

– Tony, você já foi naquele banheiro?- perguntou ele indignado.
– Sim. Qual o problema?
– Não tem porta! Como pode o banheiro não ter porta! Como eles cagam, gente? Um fica olhando o outro? – e bababá bububú…

Qual foi a surpresa do Hideo ao ouvir que havia sim uma porta.

Mas era de correr…

E o meu filho é lesado.

Mas gente…

Agora fico imaginando o que a mulher do cara e o cara estão pensando do meu filho.

Moral da história: O julgamento precipitado é sempre uma merda.

Falando de Sexo Em Família

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Fui convidada de novo para participar do programa de televisão Em Família do Canal Saúde/Fiocruz, emissora de televisão do ministério da saúde. Já havia participado de um em que discutíamos sobre privacidade na rede. Eu com o Minha Vida é um Blog Aberto fui lá para mostrar como podemos nos expôr sem fazer mal a nós mesmos. Mas no último programa que foi gravado ontem e que em breve vai ao ar, o tema era “Falando com os Filhos sobre Sexo”. Aceitei o convite, mas logo depois me desesperei. Fala sério eu em rede nacional falando de rami rami! Caraca! Se gaguejo na frente dos meus filhos, da televisão então…

Hideo, meu filho mais velho e guitarrista, pediu para eu aproveitar e dizer em rede nacional que ele é pegador profissional, Nara, minha filha que está saindo da adolescência, falou para eu contar, como eu já lhe expliquei um dia, aquela história que sai o negocim tipo um liquidozim do homem quando ele fica extremamente feliz tipo mega feliz mesmo. Yuki disse que aquele papo de rabo com semente de feijão na ponta desse rabo confunde ele até hoje (falei isso para ele na tentativa de explicar a reprodução humana de forma hiper didática e ele até hoje não entendeu). Enfim, eu não estava certa de que poderia contribuir com algo para esse tipo de programa mas vamu que vamu…

Meus dois filhos mais velhos me acompanharam no dia da gravação. Nara e Hideo sempre estão ao meu lado em momentos tensos como esse. Chegamos lá pontualmente às 9:30hs da manhã e ficamos em uma salinha esperando a hora de ir para o estúdio. Estávamos conversando com o produtor Telêmaco quando fomos interrompidos pela maquiadora me chamando para o camarim. Maquiadora?!? Ui! Que máximo! Levantei-me, e fui dançando ula-ula pelos corredores do canal mega feliz com o momento-estrela-de-roliúde.

Mal voltei para a salinha com o reboco da fuça nos trinques, chegou a outra convidada. Uma senhora para lá de simpática que se apresentou como Maria Cristina, psicóloga, terapeuta de casal e sexóloga.

– Que bom te conhecer! – disse Hideo. – Você é tudo o que minha mãe precisa!

– Mãe! Aproveita! Conversa com ela! – disse Nara mega animada.

Meus filhos acham que eu estou ficando maluca depois que me separei. Não que eu tenha feito nada excêntrico, mas ando, é verdade, sem entender o mundo e sobretudo a mim mesma. De qualquer forma, ser anunciada assim pelos filhos a uma profissional super fofa é meio barra pesada.

– Você trabalha com o quê, Elika?- perguntou-me ela curiosa.

– É. Bem. Acho que devo me apresentar primeiro como escritora. Tenho escrito muito mais do que dar aula e… ai que vergonha eu ao seu lado no programa, olha, eu não sei porquê me chamaram aqui e já te adianto que eu não sei nada sobre sexo, sou praticamente uma virgem e mal conheço esses dois aí. – disse apontando para meus filhos.

Nisso chega o produtor animado dizendo que já que Hideo e Nara estavam ali, poderiam eles também participar do programa. Oi? Eles não vão…

– Jura? Eu quero! – disse Nara.

– Posso dar meu telefone depois que eu falar tudo o que sei fazer? – perguntou Hideo.

Pronto. As chances daquilo virar uma crônica estavam definitivamente aumentando.

Nara foi chamada para se maquiar e eu resolvi acompanhá-la.

– E eu vou ficar aqui sozinho com a sexóloga? – perguntou Hideo se virando desesperado para a Maria Cristina que olhava para ele sorrindo com todos os músculos da face.

– Aproveita e se trata um pouco, meu filho! Cuida dele para mim, sim? – pedi olhando para ela que aparentemente se divertia com tanto doente em sua volta.

Hora da gravação. Na primeira parte do programa decidiram colocar a apresentadora, eu, Nara e Hideo. Somente no segundo bloco chamariam a profissional do assunto para ficar ao meu lado.

– E então, Hideo, é fácil conversar com sua mãe sobre sexo?

– Não. Impossível falar com ela sobre qualquer coisa. Tudo ela faz escândalo e chama todas as minhas namoradas de fedorentas.- respondeu ele super sério com cara de pobre coitado. Eu não estava acreditando…

– Nara, é fácil conversar com a sua mãe sobre sexo já que você é menina?

– Não. E nem posso contar todas as besteiras que ela fala para mim porque se chegar em casa ela me bate.

Mas, gente… quase dei uma bifa na Nara ali mesmo. Como assim? Helooou! Sabe lá o que é ter seus filhos diante das câmeras falando assim de você? Eles, para variar, estavam de gaiatice, mas o público não me conhece e minha imagem acabou ficando muito pior do que imaginei que ficaria se somente eu falasse sobre mim. Sei que os dois seguiram me esculachando e eu ali toda maquiada de cabelos escovados sendo bombardeada de perguntas cabeludas intercalados de comentários altamente travessos de Nara e Hideo.

No segundo bloco, entrou a Maria Cristina que chegou para salvar a minha imagem. Disse ela olhando para a apresentadora Yasmine que o importante é ter uma relação saudável, de intimidade e amizade com os filhos que o resto vem naturalmente, “algo como a relação da Elika com  a Nara e Hideo como pudemos ver”. Ufa. Amém.

E seguiu o programa com várias discussões sobre esse tema cabeludo que tem andando bem careca dado a moda da depilação. E não adianta falar o contrário ou tentar dar receita de como abordá-lo. É tabu sim senhor e vai ser sempre. Expôr a sua sexualidade é ficar literalmente e metaforicamente nu. É tenso. Somos inseguros não importa a idade porque sobre sexo todos somos neófitos. Até mesmo a sexóloga. A diferença dela para nós é que ela sabe menos ainda sobre o assunto porque estudou muito mais e, portanto, fica paradoxalmente bastante segura ao dissertar sobre o tema por entender que nessa esteira todos somos estranhos uns para os outros. Por exemplo, sexo acrobata e brinquedinhos que tanto excitam muita gente por aí a mim pouco ou nada impressionam. Por outro lado, jamais vou entender porque a posição papai e mamãe é classificada como pouco prazerosa, careta, nada criativa e sinônimo de sexo insosso para várias pessoas. E paremos por aqui porque já falei demais!

Acho eu, sinceramente, que educação sexual teremos todos enquanto vivermos porque por mais que leiamos e experimentemos o assunto é inesgotável como qualquer ser humano em si o é. Espero ter deixado claro que eu só sei que nada sei e a única coisa que posso fazer como mãe é conversar com meus filhos menos para lhes explicar algo e muito mais para trocarmos angústias, dúvidas e curiosidades sobre sexo, um jogo onde, penso eu, não há regras.

É isso. Só queria dar uma prévia do que foi essa aventura. Certamente, ao final, eu mais atrapalhei do que ajudei mas, ainda assim, o produtor falou que todos adoraram e que o programa muito em breve vai ao ar. Aguardemos, então, o resultado final.

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Segue o link do programa: http://www.canal.fiocruz.br/video/index.php?v=Falando-de-sexo-com-os-filhos-EMF-0095

Meu Ventre

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Yuki, meu caçulinha de oito anos, teve que ser entrevistado para a diretora da Escola de Música dizer se ele poderia ou não ser matriculado na aula de bateria. A entrevista foi hoje, 26 de Fevereiro, às 15h, no Méier. Ele estava nervoso e veio no carro questionando que estava querendo aprender justamente porque nada sabia e que aquela entrevista não fazia sentido. Concordei com ele, mas era protocolo da escola e vamu que vamu.

Ele entrou. Trinta minutos se passaram e eu do lado de fora sentindo como se ele estivesse numa entrevista de emprego.

– Pode entrar, mãe. Me disse a diretora mega séria cheia de óculos e notícias abrindo a porta e segurando-a para que eu adentrasse depois daquela interminável meia hora.

– Nunca vi nada igual, ela assim começou. Ele tirou nota máxima em ritmo, memória, resistência física, compreensão, raciocínio lógico e musicalidade. Essa entrevista é sempre feita para orientarmos os pais a fazer algo que ajude a criança a aprender música. Yuki, para minha grande surpresa, não precisa fazer nada. Seu filho já está pronto. É só lapidarmos esse diamante. E ele é nosso! Você vai fazer essa matrícula agora. O professor já está avisado que ganhou um presente em forma de criança. Mas você me lembra muito alguém. Você é irmã da Nara?

Nara, minha adolescente de dezesseis anos, começou a estudar canto nessa escola e fez um pouco de piano clássico lá também. Hoje faz aulas de Teatro Musical e estuda canto em uma das melhores escolas de música do Brasil com a Chiara Santoro e Mirna Rubim, na zona sul do Rio.

– Cof Cof. Eu sou a mãe da Nara.

Muitas festas, parabenizações e perguntas sobre o paradeiro dela.

– Nara foi a nossa melhor aluna aqui! Ela é outra que tem tudo!!! Já está pronta!

– Meu filho Hideo também estudou aqui.

– Você é mãe do Hideo??? – Hideo, meu primogênito de vinte a tantos anos, chegou a circular também por lá em aulas de canto. Hoje faz bacharelado em guitarra no Conservatório Brasileiro de Música.

– Caramba! Que ventre é esse, menina? Parece um palco! Não há nascimentos e sim estréias!

Vou dizer uma coisa para vocês…Chorei. Ventre que é palco foi lindimais de ouvir.

Que meus filhos continuem tornando o mundo um lugar mais agradável de se viver. Para tanto, todo o meu tempo e meu dinheiro continuarão sendo usados de forma prioritária para que eles continuem consumindo arte e aprendendo a fazê-la.

Estou extremamente orgulhosa e feliz!

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Nos Embalos de Quinta à Noite

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Hideo, meu filho de vinte e poucos anos, chegou em casa um dia desta semana querendo conversar comigo. Papo reto. Mãe, é o seguinte. Quero fazer dança de salão pra pegar mulher igual o Leonardo. Tô precisando dar uma investida nisso. Ué. Faz. Respondi. Mas, mãe, o problema é que eu não sei dançar e queria que você fosse comigo para eu não ficar isolado. Daí você seria meu par.

Bom, de dança o que eu sei dá até para fazer apresentação na rua com os  meus amigos, os postes. Quando me deixo levar pela música, posso ir para um posto e passarei desapercebida como um daqueles bonecos que soltam ar pelos braços. Eu, definitivamente, ia mais atrapalhar Hideo do que ajudá-lo.

Vai, meu filho. Deve estar assim de senhorinha cheia de ginga e doida por um garotão como você. Me deixa quieta no meu canto.  Disse eu honestamente. Mas justamente disso que quero me livrar, mãe! Senhorinha por senhorinha, eu prefiro você.

Avaliei o desespero. O caso era sério. Hideo estava de verdade determinado a conquistar novinhas com passinhos marcados de bolero e samba.

– Formô. É nóis.- Falei eu com pena do meu filhote.

Quinta, na hora combinada, lá fomos nós. Quando estávamos saindo, Nara, minha filhota fofa adolescente, quis saber o que iríamos fazer. Assim que contamos, ela bateu palmas rapidinho, disse que legal!, e se juntou ao comboio.

Ao chegar ao salão onde era a aula, uma surpresa. Ao invés de senhorinhas animadas, uns doze senhorzinhos sorridentes e cheirosééésimos. Três mulheres somente contando com a professora. Bastou uma olhada rápida para perceber que a conta não fechava. Mas vá lá. Vamos ver qual é dessa aula.

Assim que foi dada a liberdade de escolhermos o par, eu e a vaca intrusa da Nara voamos no Hideo. Planei por último, perdi. O senhorzinho de blusa coral cheirando a Azarro me puxou.

Sete oito nove e um dois três quatro esquerda e um dois três quatro direita. Lá estava eu, tronco amador, rodopiando no salão mega concentrada contando até quatro infinitas vezes.

Troca o par. Sete oito nove e um dois três quatro vai pra frente e um dois três quatro vai pra trás.

Nara estava muito pior do que eu. Parecia uma múmia. Quando nossos olhos se cruzaram, ela veio em minha direção, puxou-me para um cantim para fazer uma observação: mãe, o senhor ali falou que ele me comanda, mãe! Que é o homem que conduz a mulher. Mãe! Que lugar mais machista é esse que estamos! Eu quero conduzir aquele senhor-rexona! Shhhh, Nara. Era só o que me faltava! Quer fazer a marcha das vadias em plena aula de dança? Vai pro balé dançar sozinha ou aceita o cabresto! Mas, mãe! E aquela história toda de dominação… Sete oito nove e um dois três quatro. Caguei para Nara, agarrei o Absinto que estava me esperando.

Depois de todo mundo ter contado até quatro com pares diferentes, eu finalmente fui dançar com Hideo. Daí, dá licença, me soltei. Senti-me nos Embalos de Sábado à Noite. Não aguentava mais contar até quatro! Vai, Elika, arrebenta! Ouvi do além. Mãe! Para, mãe! Mããããe! Está todo mundo olhando!

Sosseguei. Foco no objetivo principal! Lembrou o futuro Don Juan. Ok. Parei. Ensinei, então, calmamente,  meu filho encalhado a me conduzir mostrando como o Quasar e o Água de Cheiro haviam feito comigo.

Enfim, acho que vamos além dessa aula experimental viu. Voltamos eufóricos e assim que Nelson chegou do trabalho, mostramos alegres os passos que aprendemos. Bora. Sete oito nove e um dois três… Cada um em um tempo diferente. Uma troço de doido mesmo.  Nelson entendeu que se tem uma coisa que a gente precisa é aula de dança. Deu-nos força para continuar. Apoio moral é o que há.

Assim foi o nosso fim de tarde desta quinta e, até que Hideo consiga conquistar uma menina dançando, será assim, pelo visto,  nos próximos meses. Quiçá anos. Não sei qual será o final disso, mas pelo início já valeu.